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sábado, 13 de setembro de 2014

A versão final da declaração de Naarden - ITC2014

Esta semana foi finalmente publicada a versão final da Declaração de Naarden, redigida na sequência da Conferência Internacional de Teosofia-2014.

Para perceber o contexto recomenda-se a leitura do post da semana passada.


Uma bela foto da Crystal House, em Naarden
(foto:abhidhamma.com) 

No site do ITC podemos ler o seguinte:

“Durante os quatros dias da Conferência, todos os presentes trabalharam em conjunto para “A Declaração de Naarden da Conferência Internacional de Teosofia 2014”. Recorrendo aos contributos de todos os participantes, um número de representantes das várias tradições teosóficas compilou uma proposta para a declaração. Na 2ª feira, 18 de agosto, o último dia da Conferência, o resultado foi apresentado à plateia, tendo sido recebida com muito entusiasmo e comentários construtivos.

Depois do encerramento da conferência, a proposta de declaração foi também publicada no site do ITC, de modo a que os participantes tivessem a oportunidade de enviar considerações e sugestões adicionais. A direção do ITC integrou todas as reações, mas também tentou manter o espírito da declaração tal como foi apresentada durante a conferência, o que conduziu à versão final que abaixo se apresenta.

Considerando que as Conferências Internacionais de Teosofia, Ltd. são uma plataforma onde as organizações teosóficas e os teosofistas se encontram, estimulando-se mutuamente para a  divulgação da Teosofia no mundo, esta declaração é apresentada como uma declaração conjunta, recordando-nos da cooperação fraterna durante a Conferência do ITC 2014 em Naarden. Ela expressa a nossa visão partilhada para o futuro e resume o nosso compromisso e o modo como gostaríamos de trabalhar em conjunto esse futuro.

A declaração não deve ser entendida como uma obrigação ou como um dogma.


Foto de grupo do ITC 2014


A declaração de Naarden


Respeitando a diversidade e liberdade das diferentes correntes teosóficas, esforçar-nos-emos por agir como um farol de luz, para levar ao Mundo a Teosofia, de acordo com* os ensinamentos de H.P. Blavatsky e dos seus Mestres. De modo não dogmático e através de cooperação harmoniosa fortaleceremos o movimento teosófico para o benefício da humanidade.

No espírito da unidade e fraternidade, esforçar-nos-emos nos para tornar a Teosofia uma força viva no Mundo.

Comprometemo-nos através da aprendizagem, formação e da polinização-cruzada a popularizar e a preservar os ensinamentos vivos para as gerações futuras.

*em harmonia com / em conformidade com / de modo consistente com



A direção do ITC reconhece que é praticamente impossível expor em palavras aquilo que efetivamente teve lugar durante esta conferência histórica e bem sucedida. O nosso objetivo principal e que todos partilhamos, é o de manter vivo o espírito do ITC 2014.”





Algumas considerações sobre a declaração

A declaração final publicada na passada quarta-feira contém várias alterações face ao primeiro projeto. Tenta eventualmente acomodar a opinião de alguns teosofistas da ST Adyar - com a referência mais explícita ao “não dogmatismo” - e também de alguns associados da LUT (Loja Unida de Teosofistas) e da organização de Point Loma, com a alusão aos “mestres” e não apenas a H.P. Blavatsky.

Embora isto possa parecer pouco claro a quem não está familiarizado com esta iniciativa, a verdade é que “H.P.B. e os seus mestres”, são o (grande) ponto de contacto entre as diversas tradições. Não são Krishnamurti, De Purucker ou Crosbie (por maior que seja a consideração que os teosofistas de Adyar, Point Loma ou da LUT têm, respetivamente, por essas figuras proeminentes) que irão promover o congregar de esforços entre os teosofistas das diferentes tradições.


H.P. Blavatsky

É preciso primeiro encontrar a base comum, de onde se iniciou o movimento teosófico moderno, para poder construir algo valioso para o futuro e que ajude a preservar a Teosofia. Se bem que esta nunca morrerá, a maior parte das Secções da Sociedade de Adyar têm perdido membros (bastará ver a evolução do número de pessoas habilitadas a votar nas eleições para a Presidência, ou então consultar as estatísticas, aqui, aqui e aqui). Os teosofistas da LUT também reconhecem a perda de associados e a elevada faixa etária de grande parte dos que permanecem como seus associados. Eventualmente a ST Point Loma tem crescido bastante nos últimos anos, mas basicamente está confinada à Holanda, tendo representação na Alemanha.

Outro ponto importante é o de que ninguém fica proibido de estudar seja o que for. Entenda-se que o ITC é apenas uma plataforma que definiu com esta declaração, diretrizes para trabalho conjunto por parte das organizações teosóficas e dos teosofistas que nelas estão filiados, bem como daqueles que não estão ligados a nenhuma das organizações.

Facilmente se entende que as alusões a figuras que estão associadas apenas a uma das tradições gerariam profunda desarmonia na plataforma.

A referência à “polinização-cruzada” tem a ver basicamente com o aproveitamento de sinergias. Cada uma das organizações tem os seus pontos fortes e como ficou evidente em Naarden (e com certeza noutras conferências anteriores) é fundamental a partilha deste know-how e das experiências de cada uma das organizações. Isso poderá se fazer através do convite para palestras de um teosofista de outra organização que seja especialista num determinado tema.  Mas este é apenas um exemplo, muitas outras formas existirão de fazer essa polinização-cruzada.

A palavra “formação” também me levantou certas dúvidas, mas ao que percebi a referência tem a ver com a necessidade de potenciar certas faculdades que facilitarão a disseminação da Teosofia, por exemplo no domínio da comunicação, gestão de grupos, liderança, etc…


Algumas fotos do complexo do ITC, em Naarden


O resto da declaração não gera dúvidas, nem merece comentários de maior. Eventualmente alguns prefeririam outra redação, ou a substituição de uma ou outra palavra, mas é impossível agradar a todos, nomeadamente nestas circunstâncias, ou seja, com um passado de mais de 120 anos de várias desavenças dentro do movimento teosófico (isto se contabilizarmos o período pós-Blavatsky, embora nos primeiros 16 anos da Sociedade haja já registo de muitos episódios de conflitos).

Críticas à declaração

No dia seguinte ao da declaração ter sido publicada, Erica Georgiades, deixou no seu blog algumas críticas contundentes.

A teosofista que reside na Grécia, mas que é de origem brasileira, critica dois pontos na declaração; por um lado o facto de exortar “a levar ao Mundo a Teosofia”, o que dá, na opinião da Erica, um tom messiânico, desfasado dos tempos atuais, e por outro lado, a referência explícita a “H.P. Blavatsky e aos Mestres” que ela considera divisiva.


Erica Georgiades

Apesar das réplicas já dadas por Jacques Mahnich (um dos oradores da conferência deste ano) e por Nicholas Weeks (mais contundente), Erica Georgiades não alterou a sua perspetiva.

Se em relação à segunda crítica, já acima expliquei o contexto da referência a “H.P. Blavatsky e (…) aos seus mestres”, em relação à primeira, é de referir que é absolutamente natural que os teosofistas queiram partilhar a Teosofia com mais pessoas. Obviamente que o modo como isso é levado a cabo, faz toda a diferença. 


Nicholas Weeks (à direita) com Dara Eklund,
sua esposa, que trabalhou durante vários anos
com Boris de Zirkoff

Encontramos teosofistas que fazem estudos comparativos, meticulosos e não dogmáticos e outros que apresentam a Teosofia como se de uma religião exotérica se tratasse, com escrituras e figuras divinas para adorar. Mas, esta postura não poderia estar mais distante  do espírito de Naarden.

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